quinta-feira, 16 de junho de 2011

Os pequenos tiranos e a educação no Amazonas




No dia 14 de Junho, cerca de 300 alunos da Escola Estadual Professor Sebastião Augusto Loureiro Filho, localizada no bairro Santa Etelvina, na zona Norte de Manaus, promoveram uma manifestação contra a atual gestora da escola, acusando-a de desvio de merenda, homofobia e maus tratos para com alunos. Pedagogos e alguns professores juntaram-se aos alunos da escola para pedirem providencias da Secretaria Estadual de Educação quanto às acusações. A secretaria reproduz como verdade a afirmação da gestora dizendo que 1/3 dos 900 alunos da escola estão sendo utilizados como massa de manobra por uma pedagoga insatisfeita e por um professor faltoso. A secretaria afirma que ainda estudará a situação e, caso as denuncias se confirmem, a gestora, cargo de indicação política, poderá ser afastada de suas funções. Porém, se no entender dos tecnocratas da secretaria, as reivindicações dos professores, funcionários, pedagogas e alunos não forem relevantes, estes poderão ser punidos. Punidos por exercer o principio constitucional da liberdade de expressão?
Eu como professor da Rede Municipal de Ensino de Manaus digo que esta situação poderia estar ocorrendo em grande parte das escolas, municipais e estaduais, que existem em nosso estado. Gestores incompetentes, arrogantes e autoritários é a regra e não exceção nas escolas publicas do estado e do município. Apadrinhamento político e submissão às vontades dos tecnocratas educacionais são os pré-requisitos básicos para se tornar gestor em nossas escolas, enquanto, na maioria das escolas do país, os responsáveis por estes cargos são eleitos democraticamente pela comunidade escolar. Professores, pedagogos, alunos, pais e funcionários escolhem de dois em dois anos através do voto direto um responsável por trabalhar pelas demandas da comunidade escolar junto ao poder público. Aqui estas figuras, na maioria dos casos, garotos de recado dos tecnocratas, só estão preocupadas em maquiar a situação caótica das escolas, repletas de alunos desrespeitosos (e desrespeitados), professores e pedagogos (quando tem) desmotivados e nem um pouco cativantes e gestores incompetentes, arrogantes e autoritários.
Na minha escola, Plínio Ramos Coelho, localizada na zona Leste de Manaus, a situação é calamitosa. Como na escola da diretora “homofóbica”, minha escola recebeu de presente no início do ano letivo um gestor novo e uma obra. Ele está até hoje caindo de pára-quedas e a obra já esta precisando de reparos! A escola não ofereceu livros didáticos aos alunos, constantemente os alunos são liberados por falta de merenda, não temos pedagogos para nos auxiliar, não existe laboratório de informática, a pequena biblioteca criada pela antiga gestora funciona mais como deposito de livros,... Enfim, podemos falar que a única coisa que funciona em nossa escola é o livro de ponto. A nossa motivação para dar aula é esta: desconto em nossa já tão descontada folha de pagamento.
Ao Invés da Seduc ameaçar com punições aos envolvidos na manifestação deveria homenageá-los pela demonstração de compromisso com a construção de uma educação mais justa, horizontal e plural, onde pais, alunos, professores e funcionários participem da detecção dos problemas e nas formulações de alternativas. Não precisamos de tecnocratas com cheiro de ar condicionado para pensar a escola e a educação por nos. Podem pensar com nós,não em nosso lugar.
Fica aqui mais do que meu apoio a estes professores, pedagogos, funcionários e alunos, fica minha admiração, respeito, agradecimento e orgulho em ver que nem todos abaixam a cabeça frente aos pequenos tiranos que infestam nossas escolas. Que este exercício de cidadania possa ser a chama que incendiará os corações e mentes daqueles que ainda tem esperança em uma educação libertadora, voltada para a construção de um novo tipo de sociedade, mais solidária, responsável e livre.
Wander Lúcio Mourão Junior, professor de geografia e artes da Escola Municipal Plínio Ramos Coelho.
Manaus, 15 de junho de 2011

terça-feira, 22 de março de 2011

Desde os tempos de escola

Desde meus tempos de escola, essa instituição voltada ao modelamento de humanos para o mercado de trabalho, eu não entendia o porquê deu estar ali. Me lembro nitidamente de uma situação em que na sétima série, eu estava mais uma vez na sala dos professores, após ser expulso de sala, e uma coordenadora me perguntou:

Lucas, você não se cansa de vir aqui?

E eu logo respondi:- Não, aqui é melhor que na sala, e como eu não quero ficar naquela sala o tempo todo, não me importo de passar um tempo aqui.

Aquilo claro chocou todo mundo, mas na minha cabeça pré-adolescente, eu estava simplesmente contestando uma situação à qual eu me via desde que me lembrava por gente. Não concordava em estar ali, e ninguém nunca tinha me dado uma resposta digna de me conformar. Era sempre algo do tipo, "a escola vai te preparar para o mercado" , "se você não estudar como vai passar no vestibular?", "sem estudo você vai ser um Zé ninguém". O argumento nunca era voltado a dizer, bem você aqui na escola vai ter amigos, vai crescer como ser humano e vai aprender muitos valores, que na rua você não aprenderia. Claro que esses valores, são a única coisa que aprendi, pois o conteúdo se foi no emaranhado de informação que meu cérebro ao longo dos anos fora bombardeado. Não lembro nada de matriz, equação de segundo grau, nem de teoremas. Lembro sim que tenho que chegar cedo a aula, não posso me atrasar, tenho que respeitar a hierarquia, e aceitar as coisas apenas para um dia poder aposentar. Desde a escola já se pensa na aposentadoria. É sempre me diziam, a escola é a melhor época da vida, depois fica pior. Poxa, na minha cabeça infantil não tinha como ficar pior. Eu era forçado a estar ali sentado, ouvindo uma carocha qualquer, simplesmente para ser preparado como mão de obra para que nossa sociedade sempre evolua num ritmo sem nexo.

Bem partindo agora para o erro principal de tal conjunto e ao qual nunca se contesta. A universidade. Meus professores, como disse antes, simplesmente diziam que se eu não estudasse, não passaria no vestibular. Mas o que é isso? Nos meus dozes, treze anos eu não fazia idéia do que era vestibular, universidade, pra mim era um mundo distante ao qual só ia gente grande e eu não queria estar lá, pois onde tem gente grande, criança não tem vez. E assim, com a educação voltada única e exclusivamente para assegurar uma vaga na universidade, fui moldando minha vida a ponto de no ensino médio, desistir de tamanha loucura coletiva que se instaurava no colégio, onde diziam, se você não fizer um bom ensino médio você não vai passar no vestibular, e ai o que você vai ser da vida?

Bem nesse momento eu escolhi ser técnico em informática, e sai de uma escola conceituada o Magnum, para estudar no Cotemig, que tinha outro modelo político-pedagogico, esse voltado muito mais a formar profissionais para o mercado, não importando o aprendizado das matérias que caem no vestibular. Felizmente pra mim, consegui fazer o ensino técnico, e me formar como técnico em informática, e logo depois passar no vestibular. Fiz cursinho 1 ano, junto de vários colegas do Magnum, que não passaram direto, e que não tinha portanto um diploma de técnico como eu. Estava à frente na concorrência pelo mercado, mas eu tinha que entrar numa universidade, pois é o modo de ascensão social diríamos mais famoso, e fácil. Se faz engenharia, medicina para ficar rico. Ninguém quer ser professor, por que isso não da dinheiro, e de que adianta ter entrado em um universidade se você não vai ganhar dinheiro? A concorrência é desleal. Enquanto você passa 4, 5 anos dentro da universidade, montando um currículo cheio de estágios, seu concorrente de mercado, já atua como profissional na área há 5 anos, e tem muito mais experiência que você. Bem experiência é muito mais importante que conhecimento, pois é mais valorizada em qualquer área. Esse funil de pessoas com ensino superior, tem aumentado, mas de nada adianta, pois quem detem o poder ainda são os com mais tempo de estudo. Antigamente os bacharéis eram os principais homens do país, hoje são os pós doutores. E o reuni insiste em agregar pessoas no ensino superior, sem se preocupar em melhorar a qualidade do ensino, e ai a Faculdade deixou de ser um local onde a pessoa se realizava quanto pensador de algo e descobridor de um mundo muito mais complexo, e virou continuidade da escola.

E ai, o que minha professora em 2000 me dizia, continua fazendo todo sentido. Se eu não estudar na escola não poderei estudar numa universidade, e pra que ir pra uma universidade que imita a escola? Hora, para me adequar melhor, ter mais técnica, e poder entrar no mercado mais qualificado, com um pequeno diferencial. Sem experiência.

O que penso sobre tudo isso? Que ainda continuamos a criticar o estado que deixa a escola publica em péssimas condições, para formar apenas mão de obra simples e pouco qualificada, necessária a deixar os baixos salários como estão. E quando nossa critica se volta a uma universidade que não deixa de ser uma reprodução do estado e do mercado, criticamos o ponto final de uma longa história. A escola básica é que deveria ser mudada, e ela vem sendo. Mas de forma completamente bárbara. Muda-se a escola pública que se torna uma formadora de homens, cidadãos. Enquanto a particular continua a copiar os modelos que a universidade pede, alunos que passa no vestibular, e se formam como técnicos. Enquanto os cidadãos se fodem na sociedade, os tecnocratas enriquecem. Uma desigualdade sem fim, caminhos diferentes, famosa maldade. Essa maldade é fácil de ser entendida, já diziam As Meninas, no seu clássico ‘Bom Xibom Xibom Bom Bom’, “ é que o de cima sobe e o de baixo desce.”

Pensar diferente é também agir diferente, e pensando em táticas de mudança é necessário pensar em ações. Uma dica, surgida em conversar com a galera, é a de intervenções rápidas nas escolas. Não quero ser um professor que passará a vida toda se frustrando no método atual de ensino, porque eu não concordo e nunca concordei com a Escola. A idéia é pegar desgninações, curtas, 3, 4 meses, e fazer dinâmicas com a sala de aula em que você estiver atuando. Dinâmicas voltadas a contestar o modelo hierárquico, as relações de poder entre professor aluno, e também entre aluno-aluno. Fazer os alunos verem que existem outras formas de se aprender, uma outra educação é possível, e porque seguir algo que no fundo só os transformara em zumbis?

Mudar é difícil, mas não impossível, já dizia o grande Paulo Freire. Várias pessoas fazendo dinâmicas e mudando comportamento da galera, em um curto período, poderia simplesmente em um prazo de alguns anos, transformar o pensamento dos estudantes, que são simplesmente os que menos tem voz. Muito se critica sobre a postura dos professores, mas e os alunos? Os alunos não fazem a menor idéia do que tá acontecendo, e uma luz para eles, pode mudar todo um contexto. Se alguém me desse essa luz nos anos 2000, poderia ter mudado muito minha vida. Fingir que nada acontece é fácil, mas agir e tentar mudar exige esforço e trabalho, e ai bora trabalhar!

No dia que a educação for voltada simplesmente para se formar pessoas, o mundo será um lugar melhor! Simples assim!